segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Timidez - Medo do Mundo


Todas as pessoas têm traços de timidez.

Até as mais extrovertidas podem ficar tímidas em situações específicas. A isto chamamos de timidez situacional.

Mas há os que sofrem com a timidez crônica, que é a constante, ou seja, a pessoa experimenta essa dificuldade em praticamente todas as áreas de convívio.

Vou falar aqui da timidez em seu estado mais intenso.

Timidez pode ser definida como um estado de acanhamento excessivo.

E pode trazer um sofrimento maior do que sonha quem não experimenta esta realidade.

Ser tímido é ter vergonha de dançar naquela festa, quando é na verdade sua maior vontade, mas, mesmo desejando muito, ficar paralisado.

Timidez é ter pavor só de imaginar vários rostos se voltando para si, esperando um discurso ou manifestação de sua parte.

É querer sumir, virar fumaça para não ter que se destacar entre um grupo.

É sofrer com a ansiedade no conflito entre desejar, mas não conseguir se integrar.

É viver o impedimento de um sonho, de uma conversa com aquela pessoa por quem está apaixonado.

Ou mesmo viver a incapacidade diante de uma atitude tão simples como fazer uma pergunta ao professor diante da sala.

A timidez, conforme o grau, pode causar enorme impacto no desenvolvimento de alguém, já que limita, desanima, causa um mal-estar terrível, fazendo com que a pessoa se retire, se esconda, se proteja demais, e o pior, acabe por se classificar como inferior.

Há inclusive que se considerar a real possibilidade do caminho para uma depressão em quem é tímido demais.

Timidez pode ser tanto uma condição, como um traço de personalidade. 
Mas traz na verdade medo.

Medo de ser julgado inadequado.

De onde vem a timidez?

Por que há pessoas tão extrovertidas, que não tem o menor problema em se exibir, enquanto outras fugiriam do mundo se pudessem?

Por um lado, podemos falar de característica pessoal, já que desde cedo se pode observar, por exemplo, que num grupo de crianças já existem aquelas que são mais soltas, e as que são mais recatadas, mesmo que muito pequenas.

No mais, podemos pensar que situações experimentadas durante a vida podem ter acarretado ou reforçado a condição da timidez.

Nesse sentido podemos imaginar alguém que viveu num lar sob severa repressão, por exemplo. Onde não podia se manifestar, nem colocar opiniões. Um ambiente onde soava a idéia de que não era aceito, de que não podia existir, de que sua presença não fazia diferença.

Situações assim são mais comuns do que podemos imaginar.

Porque timidez também tem a ver com autoestima, com se achar importante, com se sentir livre para achar-se, para pronunciar-se, para ser querido e amado.

Muitas pessoas são tímidas por não se enquadrarem nos padrões físicos de perfeição, ou porque têm alguma deficiência, ou qualquer outro detalhe que lhes faça desigual, que lhes cause a sensação de desencaixe.

Muitas vezes o que é considerado como ponto de inadequação é potencializado pela fase da idade.

Os adolescentes, por exemplo, vivem essa fase tão delicada e frágil com relação à sua autoimagem e importância, estão formando sua identidade e estruturando a autoconfiança. Precisam se sentir fazendo parte, sendo aceito pelo grupo.

Se a pessoa que já carrega esta vulnerabilidade, se deparar com o dissabor de um processo de bullying, então, pode ser o fim da sua vida, literalmente.

O tímido tem medo da crítica, da desaprovação. Seu maior pesadelo seria escutar algo que viesse a confirmar seu estado de inconveniência, e viver uma humilhação.

Então, se aprofundarmos, chegaremos na essência desse medo, que é o do desacolhimento, do desprezo, da rejeição.

É o medo de ser censurado, reprovado, negado.

E ser enjeitado vai de encontro com parte de um instinto de vida, sobrevida.

Porque não participar de um grupo é como morrer, na leitura inconsciente ancestral de que ser excluído seria não poder obter parte da caça, alimento conseguido com organização de equipe, mesmo que fosse nos tempos da pedra.

Além disso, como um Ser complexo que somos, trazemos a necessidade natural do afago, da proteção, significado de que seremos cuidados, que não faleceremos diante do menosprezo.

A timidez excessiva requer tratamento, intervenção, já que impede o desenvolvimento do indivíduo, que pode sofrer as consequências pela alienação, tristeza e solidão.

No fundo as pessoas tímidas podem ser mais inteligentes, sensíveis e especiais, pois são mais analíticas, observadoras, sempre escutam mais do que falam. Podem ser verdadeiros artistas.

Ao adentrar no processo de autoconhecimento precisará entender que a timidez não é um defeito, mas que pode ser um traço de personalidade que precisa ser ressignificado à medida que o trabalho psicoterapêutico progride no sentido de ajudá-la a reconhecer o seu valor, identificando seus medos e prováveis origens.

E poderá descobrir que ser uma pessoa tímida não inclui necessariamente o sofrimento, e que é possível aprender a se amar e ter o controle para lidar com as situações.   

Antes eu achava que minha timidez era o problema. Agora eu vejo que o problema é usar minha timidez como desculpa para não viver. ” Helen Rowland.

Rosangela Tavares


sexta-feira, 28 de abril de 2017

Viver a Dois - Quando o afeto fica para depois


Há muito tempo eu aprendi que os casais não se separam pela toalha jogada em cima da cama.

Não, eles se separam pelo significado que há por trás dessa situação.

Quando eu recebo casais no meu consultório, presumidamente dispostos a reverem sua vida e se acertarem, é interessante ver como os sentimentos são trazidos projetados nas atividades que realizam em casa, nas questões que envolvem objetos materiais, nos cuidados com o animal de estimação, na porta que o outro esqueceu de fechar.

Não há como negar que o maior sofrimento e impacto dentro da convivência tem a ver com as diferenças.

Por vezes os parceiros se esquecem de que cada um veio de uma infância particular, famílias e criações diferentes, histórias de vida e mundos interiores distintos. E que na verdade essa diferença não cessará quando as escovas de dentes repousarem no mesmo recipiente.

Então se juntam e acreditam em algum nível, que o outro será igual a si.
E quando a realidade diferente passa a se impor no dia a dia, a desarmonia se estabelece.

Se a batalha por fazer valer cada qual o seu comportamento e ponto de vista, seguir para o caminho do “ego”, então a coisa piora.

E geralmente é exatamente isso que acontece.

A guerra pode seguir pela via da estratégia: “Se você não faz a sua parte lavando a louça, então eu também não passarei as suas camisas! ”.

Isso porque, por trás da visão da louça acumulada na pia, existe uma mensagem que grita: “Você não está mesmo nem aí pelo que eu te peço. ”

Dessa forma cada um, que ao fazer a escolha pela união eterna, enquanto sonhava que viver junto seria a continuidade de um relacionamento apaixonado e cheio de bons momentos, pode começar a reagir negativamente, seja pelo viés da raiva e agressividade, indiferença, “greve de intimidade” ou pequenas vinganças.

Perceber nesse ponto, que na verdade estão tomando o rumo do distanciamento, objetivo contrário do que se busca na escolha de se unir com outra vida, é essencial para procurar ajuda, sentar para conversar, rever a dinâmica ruim que se estabeleceu, tentar o resgate.

E francamente, nesse momento a condição que mais facilitará qualquer tipo de ajuste e transformação é, sem dúvida, a maturidade.

Mas antes de mais nada, o que tem que ser compreendido, é que o primeiro mandamento da união estável e harmônica, é a busca pelo prazer de dividir a vida com alguém em nome do amor.

É dividir e conversar, compartilhar até mesmo as bobagens do seu dia, querer jantar junto, prezar a imprescindível boa comunicação para não padecer nos trocadilhos dos mal-entendidos.

Ah, não esquecendo que o tradicional carinho em um momento não esperado sempre enriquece aos dois corações.

Quando um casal chega no ponto de não suportar mais o jeito diferente do outro fazer as coisas, precisa acima de tudo rever seu caminho, recordar que provavelmente a primeira idéia no sonho de dividir tudo, era exatamente o que está sendo deixado de lado, consumido pela discussão e trocas negativas: o afeto.

Quando se consegue manter a perspectiva do relacionamento através da lente do afeto genuíno, então tudo fica diferente.

O ciclo pode se inverter na mensagem segura de que se o outro deixou a louça é porque deve estar muito cansado, e que então não há problemas em, dessa vez, auxiliá-lo com tranquilidade e carinho. E receber isso de volta em próxima circunstância.

Estar de comum acordo com seu companheiro sobre tudo, dialogando de forma clara e precisa sobre o que é importante para cada um, em todos os aspectos possíveis, é quase a solução perfeita.

No mais, não resta dúvidas de que a disposição em investir na felicidade dos dois, a preocupação e empatia com o outro, são os ingredientes que complementarão perfeitamente a receita do bom conviver.


Sendo assim, o caminho a seguir pelos pombinhos é exatamente o contrário do que leva ao desentendimento e desgosto: iniciar pela clareza e troca sobre preferências para tudo, boa vontade e compreensão, considerando que a base da escolha pela viagem do casamento sempre foi a afeição e benquerença.

Rosangela Tavares